terça-feira, 4 de novembro de 2014

Caderno vai e vem

O Caderno vai e vem surgiu na tentativa de responder a uma problemática. Era a primeira vez que iria estar à frente de um grupo de crianças, crianças com idades entendidas entre os 3 e 4 anos, sendo que a grande maioria se encontrava na sala pela primeira vez, tinham vindo da creche, onde os ritmos eram diferentes, as áreas, a organização de toda a sala e atividades, tudo era novo para eles e para mim, o que se poderia tornar um fator de ansiedade por ambos os lados. Ansiedade que acabou por se revelar por parte de alguns pais, pois estes sabiam que aquela seria a minha primeira experiência, assim como aquela era uma nova “etapa” para os seus filhos. Queria que os pais encarassem o Jardim-de-Infância, mais especificamente a minha sala, como um espaço privilegiado de interação social que permitia a cada criança partilhar e trocar experiências, momentos de grande valor emocional e afetivo, importantes para o desenvolvimento individual assim como do grupo.
Queria, ainda, provar a mim mesma que conseguiria realizar este projeto, que tinha sido um pouco desacreditado por parte dos restantes adultos da instituição, como a educadora Vera afirmou:
Inicialmente quando a Raquel me falou do Caderno vai e vem achei uma ideia bastante ambiciosa e que exigia tempo e paciência para o concretizar. Pensei que era uma ideia de alguém que está a começar agora, que chega a casa e não tem que fazer jantar, arrumar a casa, dar banho ao filho, dar jantar ao filho, brincar com o filho, etc, etc, até chegar à hora de se deitar.
Este seria, então, um desafio que estava pronta a tomar.
Mas afinal no que consistia o Caderno vai e vem? Era algo, a meu ver, muito simples. A semana decorria de forma natural, havia atividades, previamente planeadas, brincadeiras, momentos chave próprios de uma rotina num jardim-de-infância. Eu ia registando fotograficamente vários momentos do dia, para que depois, estes fizessem parte do relatório semanal presente no caderno. Todas as sextas-feiras, realizávamos, à semelhança do que acontece no MEM, uma “reunião”, ou seja, juntávamos os adultos responsáveis pela sala e, claro, todas as crianças. Esse espaço tinha como propósito que as crianças relatassem o que se havia passado ao longo da semana, refletissem o que tinham feito, dialogassem umas com as outras, e que tomassem decisões, entre outros aspetos que na altura ainda não se encontravam “formalizados” para este projeto. Nesse mesmo convívio, decidia-se, aleatoriamente, ou com a aprovação de todo o grupo, quem levaria o caderno para casa durante o fim-de-semana. O objetivo seria, em conjunto com os pais, a criança, há semelhança do que acontecia durante a semana, relatasse o seu fim-de-semana em contexto familiar, com ou sem fotografias, apenas se pedia um registo do que tinha acontecido no fim-de-semana da criança.
A Lei-Quadro para a Educação Pré-Escolar define a educação pré-escolar, como sendo:
(…) a primeira etapa da educação básica no processo de educação ao longo da vida, sendo complementar da ação educativa da família com a qual deve estabelecer estreita relação, favorecendo a formação e o desenvolvimento equilibrado da criança, tendo em vista a sua plena inserção como ser autónomo, livre e solidário. (Lei n.º 5/97, de 10 de Fevereiro, art.º 2)
Criar a “estreita relação” era um dos meus objetivos, sendo que esta iria promover outro tipo de vantagens que abaixo serão apresentadas. A partilha também era desejada, a partilha de momentos vividos ao longo do ano letivo, relatado no caderno, e os momentos familiares vividos pela criança. Com isto queria aproximar os pais do contexto escolar, dar a conhecer, e dar a oportunidade de participarem, de forma diferente, no mesmo.
Com o caderno iria um livro infanto-juvenil da Educadora de Infância, ou seja, meu, que era escolhido pela criança eleita. O livro tinha como objetivo dar a conhecer aos pais, livros de qualidade, tentar proporcionar um momento de qualidade entre os pais e a criança, ao estarem juntos na descoberta do livro. Também foi tido em conta que alguns pais poderiam não ter a oportunidade de, durante o fim-de-semana, vivenciar com a criança um momento chave, um momento “digno” de partilhar, assim, o livro possibilitaria a criação desse momento, dando a oportunidade de, em conjunto, relatarem no caderno quais as emoções, sensações que aquele momento lhes tinham proporcionado.
Na semana seguinte, na entrega do caderno, a criança iria relatar ao restante grupo, com o auxílio da Educadora e do próprio caderno, o que havia acontecido, o que tinha aprendido, o que tinha vivenciado dentro de um contexto mais familiar e pessoal. Queria que as restantes crianças tivessem a oportunidade de, também, se possível, vivenciar também os acontecimentos, as atividades da criança em questão com o relato da mesa. Depois do relato, e da troca de ideias entre as crianças, se possível, eu desenvolvia uma atividade relacionada com o tema tratado, na tentativa de potencializar a participação da criança, dando valor às suas vivencias e à participação e empenho dos pais.

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